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ANTROPOLOGIA DO IMAGINÁRIO

Licenciatura - Nível 

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Professora: Lorilei Secco

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MAIARA DIDONÉ

Fonte: JARDIM DO HERMES, 2020.

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A obra em análise é chamada de Cartografia Central de Gustavo Prata e foi realizada em 2015, com dimensões de 102 x 82 cm, utilizando a técnica da assemblage a partir de colagem. O artista desenvolveu essa produção para o Wesley Duke Lee Art Institute de São Paulo.

Para Madeira (2016, p. 353-354),

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De acordo com a autora, a assemblage assim como a colagem, representam o eixo das relações artísticas na contemporaneidade. Na obra Cartografia Central construída num plano bidimensional, os objetos se expandem e atingem o tridimensional. Diferentes texturas podem ser vistas a partir da imagem da obra, como no terno de Wesley onde aparecem recortes estampadas remetendo à Op Art e aos estudos do artista sobre os efeitos do ácido lisérgico. A máscara oriental e os escritos partem da pesquisa de texturas multiétnicas que simbolizam as diversidades culturais que motivaram Duke Lee em sua carreira. A parte da pele foi construída de recortes de revistas com nus e formam a face. Dentro do rosto há mais recortes de imagens de objetos que fizeram parte da vida do artista em sua casa. Símbolos e lembranças dispostos em um mapa que representam a organização do inconsciente, assim como funções de atalhos para as memórias, já que o artista sofria do Mal de Alzheimer. Diversos outros materiais Prata utilizou nessa obra, como o papel milimetrado, a madeira e a placa de foam.

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Na composição logo são percebidas inúmeras linguagens visuais.  Linhas na vertical, horizontal, formas circulares no rosto, máscara, anel, diferentes objetos  e na roupa, pontos de diferentes tamanhos, quadriculados, movimentos arredondados e pontiagudos, assim, como nos símbolos do rosto. Também, num olhar imediato percebe-se que há três escalas, como a máscara e a cabeça (e/ou pessoa) remetendo ao primeiro e segundo plano, respectivamente, e, ao fundo, escritos em mandarim que despertam curiosidade. Trata-se de um retrato em movimento como se a figura central estivesse tirando a máscara para revelar seu interior, ou seja, o universo do artista brasileiro Wesley Duke Lee que faleceu no ano de 2010. Temática essa que justifica o nome da obra, Cartografia Central, enquanto uma espécie de “mapa”. 

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São trazidas inúmeras cores em tonalidades diversificadas. O preto e branco no terno remetem ao próprio significado da arte ótica como “ilusão do olhar”.  O vermelho aparece predominando nas escritas facilitando a relação com a cultura oriental, e na máscara que pode simbolizar uma falsa identidade. Através dela, arquétipos advindos de mitos podem ser materializados. Ainda nela, observa-se o azul com tons diferentes, como se fossem sombras nem rosto. Outras cores como o marrom, amarelo, bege e verde também estão presentes e interpreto que podem estar ligadas com a origem dos objetos de Wesley.

Já em relação aos arquétipos, tomou-se por base o estudo de Fialho e Senna (2016, p. 40) sobre o que apresenta Carl Gustav Jung. 

 

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O arquétipo claramente observado na obra é relativo a persona, como se retirasse a máscara exposta para uma sociedade e revelasse a pessoa que há por trás dela. É como se o artista assumisse um papel que não lhe pertencia, como se não fosse ele a causar a impressão esperada pelos outros. Afinal, quem fez essa representação foi outro artista que traz a máscara para a composição, como se conhecesse bem o interior do representado. 

Há vários outros aspectos que podem ser simbólicos: no rosto essas figuras de animais podem ser relacionadas ao sagrado; objetos de uso diário como um relógio, livros, talvez retratos. Difícil de definir esses recortes, mas, possivelmente, havia um significado importante para Wesley Duke Lee. 

No primeiro olhar, múltiplas sensações surgiram em mim, queria saber mais sobre a obra, pois estava tirando conclusões apressadas e talvez equivocadas. Fiz assim uma análise inicial, sem nenhum aprofundamento de pesquisa. Após, percebi o quão necessário era essa coleta de informações e fui buscar outras fontes como, redes sociais do artista, sites que escreveram sobre a obra, onde obtive alguns materiais que me auxiliaram a produzir essa síntese. O título é exatamente esse mapeamento da vida do artista, esse estudo que Gustavo Prata realizou em todo o processo voltado ao Duke Lee. A obra além de retratar a vida desse último artista, também quis mostrar a importância de diferentes momentos e memórias que ele carregou em sua bagagem, com seus estudos, seus objetos e suas particularidades. 

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A colagem e o assemblage – duas técnicas que estão no cerne das práticas artísticas contemporâneas  –  são  representativas  da  ruptura  com um conjunto de valores que tiveram vigência na arte ocidental desde pelo menos  o  Romantismo  até  a  alta  Modernidade,  tais  como  a  autonomia da arte (a finalidade sem fim, de Kant ou a “arte pela arte” dos poetas parnasianos); o artista como fonte e fulcro do sentido (recuo do sujeito e da autoria individual); e a hierarquia dos materiais classificados como nobres ou vulgares.

                                             

De posse dessas constatações, Jung (2000) descreve, então, o conceito de “arquétipo” como sendo algo que nos ocupa. Para o autor, a denominação é precisa e de grande valia, pois diz que, no concernente aos conteúdos do inconsciente coletivo, são tratados tipos primordiais de imagens universais, que existem desde os tempos mais remotos.

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RAQUEL MANICA

 Sem título (2003), Alexis Azevedo Morais

Fonte: ISSUU, 2016.

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A imagem da obra mostrada acima, é uma intervenção digital sobre fotografias com dimensões de 90 x 136cm, que faz parte de uma das séries denominadas  Produções em artes visuais: manipulações digitais, do artista Alexis Azevedo Morais. É possível trazer ao encontro da linguagem utilizada pelo artista a possibilidade do trabalho estar próximo da pintura e da fotografia  mediante algum  processo  de  edição,  pois através  das mesmas é  possível  obter contrastes de luz e sombra, como também a imagem da figura humana duplicada (ISSUU, 2016). 

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O artista Alexis é de nacionalidade brasileira e ainda não existem informações específicas a respeito desta obra, mas conforme o seu portfolio, grande parte da produção foi feita na cidade de Belo Horizonte (MG) e situa-se enquanto arte contemporânea, arte educação e arte urbana. Atualmente, ele é professor do Departamento de Artes Plásticas da Escola Guignard da Universidade do Estado de Minas Gerais, possui graduação em Artes Plásticas na mesma instituição e realizou seu mestrado em Artes Visuales na Universidad Nacional Autónoma de Mexico. 

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A obra traz um registro autobiográfico que, se comparada com outras produções da série, dá a entender que, através de ferramentas e suportes da fotografia, o próprio artista tenha executado todo o processo, desde o momento inicial até a pós-produção. No entanto, nada foi encontrado sobre a suposta participação de uma segunda pessoa. A linguagem artística utilizada foi a fotográfica, tendo recebido intervenções por meio digital, indicando certa perspectiva do espaço com um elemento em primeiro plano e outro em segundo, criando certa profundidade no enquadramento. 

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Mostra figuras humanas estáticas, como se estivessem trocando olhares. Aparece um tecido pendurado na parede, do lado direito da imagem, por detrás da cabeceira e alcança uma altura que vai até a extremidade superior da fotografia, indicando ser uma cortina que reflete uma luz natural e suave vinda do lado de fora do ambiente. Essa luz é refletida também numa parte da cabeceira que está logo abaixo da janela e se projeta lateralmente na figura humana em primeiro plano, deixando uma sombra marcada no seu lado esquerdo. Já quem está deitado sobre a cama, parece receber iluminação vinda também de cima (MACPARANA, 2020).

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Os tons neutros predominam na cena! A parede do espaço no qual se encontram os personagens e os tecidos que estão dispostos sobre a cama são brancos trazendo certa suavidade, bem como, a peça de roupa dos membros inferiores da pessoa que está à frente, apenas diferenciado-se em uma leve textura. A cor da pele também é clara aproximando-se do tom palha da cortina que parece ter uma textura, porém não está tão visível. Já a cabeceira demonstra ser de madeira pelo seu aspecto. 

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Segundo Chevalier e Gheerbrant (1986), a cor branca é oposta da preta, situando-se nas extremidades da faixa cromática, significando respectivamente, a soma ou a ausência, uma hora sendo início, noutra o final da vida. “O momento de morte - é também um momento transitório na dobradiça do visível e do invisível, e, portanto, outro começo”. Para o pintor Wassily Kandinsky (s.d.), a cor traz reflexões além da estética:  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Já a cor preta  no ocidente, simbólica e culturalmente,  é  mais entendida  em  seu  aspecto  frio  ou  negativo.  

A obra apresenta um espelhamento da figura humana e aponta para um paradoxo da identidade que está sendo alterada, negociada ou talvez, questionada. Ela integra uma série que foi referenciada pelo mito de Narciso da mitologia grega, aquele que buscava no outro sua identidade. A narrative desse tema conta que um jovem muito bonito despertava o interesse de homens e mulheres, mas desprezava a todos, e por isso era conhecido como uma pessoa bastante arrogante. Não valorizava o amor das ninfas, nem mesmo de Eco, então, jogaram sobre ele uma “maldição”, a de que se apaixonaria com muita intensidade sem poder ter para si a pessoa amada. Certa vez, ele se inclinou para beber água de uma fonte e vendo seu próprio reflex, ficou encantado! Sem saber que aquela imagem refletida na água era a sua, tentou abraçá-la e caiu na água, morrendo afogado. Outras versões narram que Narciso acaba se apaixonando por sua irmã gêmea e não por si mesmo (GALAHAD, 2019). 

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Abordando o tema, Alexis traz questões de gêneros, buscando descontruir alguns clichês construídos culturalmente. Ao entrar em contato com a imagem da obra, relacionei diretamente às questões de gênero, porém, como ela foi premiada no 60º Salão Paranaense e trazia consigo um texto informativo, constatei que, de certa forma, existia sim esta relação, mas a temática mais relevante seria a de identidade. Pode   ser   relacionada assim,    com   o   contexto das Selfies ou autorretratos contemporâneos das redes sociais. Com o crescimento da fotografia digital, os aparelhos tecnológicos, principalmente os celulares, fazem parte do nosso cotidiano, sendo que os autorretratos trazem muitos elementos a respeito da nossa identidade.

 

Se olharmos mais atrás no tempo, dentre outros, tem-se o exemplo o artista Van Gogh que fez uma série de trabalhos a partir dos seus próprios autorretratos e buscava neles muito mais que a prática artística em si, mas o autoconhecimento através do estudo das cores, pinceladas e expresses. Estabelecendo um diálogo entre Van  Gogh  e  os  autorretratos  contemporâneos,  existe certa semelhançaos quando os usuários das redes sociais utilizam, como forma de manipulação da própria imagem, a escolha dos filtros, efeitos e figuras que indicam as emoções de quem está por trás da camera. Isso sem esquecer de levar em conta o seu tempo de produção! Por isso vivemos um momento em que, o tempo todo, “precisamos” ser fotografados, e com isso, acabamos sendo mais reconhecidos por aspectos  visuais e superficiais,  do  que  propriamente  em essência  (BLAUTH; MACHADO e RUEDA, 2019). 

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Após esta interpretação, minha percepção a respeito da obra sofreu algumas alterações, buscando entender mais o aspecto que está além do explícito e relacionando os elementos trazidos pelas fontes como suporte para criar diálogos com os contextos contemporâneos, afins de estabelecer maior sentido nas produções de artes.

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“[...] o branco, que muitas vezes tem sido considerado como um "sem cor" é como o símbolo de um mundo onde todas as cores, como propriedades de substâncias materiais, se desbotaram. O branco age em nossa alma como o silêncio absoluto. Este silêncio não está morto, mas cheio de possibilidades de vida [...]”. 

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